5/29/2007

Trilha

Meu primeiro copo. A bebida, às vezes, parece fazer bem. Não sei ainda para onde vou. Preciso de movimento, barulho, tentar povoar minha noite. O copo está vazio. - Cadê a chave do carro? - Me sinto neste exato momento como Mersault, personagem de Camus, saindo de um hotelzinho barato em Praga para certificar-se da vida. O terceiro copo tomo pelo caminho. Poderia acender um cigarro. Só não acendo porque não tenho nenhum. O vento que corre pela janela do carro anestesia. Tomo uma direção e um gole. Deixo-me tomar por um pensamento. Fujo. É dele que estou fugindo. Mais um gole. O copo esvazia... a boca seca. O pensamento volta. “Bird” sola semi semi-fusas... com esta trilha chego ao fim da trilha. Encosto o carro. Despenco até o bar. Copo cheio. Lugar cheio. Mente finalmente vazia observa. Observo a coreografia que não para. Garçons, bêbados felizes, fêmeas amargas... Fêmeas esfuziantes, bêbados amargos, garçons... E ei que de repente um corvo Eu digo.”Sai daí corvo velho!”, e ele responde.” Nunca mais!”. Consigo um cigarro com um camarada próximo. A nicotina é realmente repugnante. Fico algum tempo entretido na fumaça que sobe, se enrosca e desaparece. Ascende e desaparece. Apago o cigarro. No balcão, o copo não fica vazio. Do gargalo à garganta é só questão de tempo... tempo... tempo passa. Passaram esfuminho no ambiente? As idéias estão um cubo mágico embaralhado. Onde começa? Onde termina? ... Porra ! Isso é Escher ! Entro no carro sem itinerário. Lugar algum pode ser longe... pode ser perto... uma grande (interrogação) Esta realidade absurda. Meus olhos se fixam nos olhos que encontram no retrovisor... Lugar algum pode ser algum lugar. Pode ser lugar nenhum. A trilha é um free jazz. De lá para cá. Dali para lá... só objetos distorcidos. O olho se corta na navalha... a lua ilumina o que tenta esconder-se na escuridão... o farol do carro ofusca e paralisa por instante o olho que me olha diretamente, e o gato arrisca atravessar no caminho. Sigo sem trela às estranhezas. Vou dormir.

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